terça-feira, 5 de fevereiro de 2013

O outro lado de Amsterdam

Relativamente ao meu último post, Amsterdam Underground o que posso eu dizer!? Foi uma experiência intensa, interessante, perturbadora e quase chocante. Possivelmente ainda consigo ser a menina ingénua que viveu 22 anos numa pequena aldeia no nordeste algarvio. 
Testemunhos como o do Frank (o nosso guia) deixam-me um nadinha perturbada e depois levo uns dias a digerir o assunto. Eu que sou educadora social, mas em primeiro lugar um ser humano, sensível que só eu!
O Frank contou-nos na primeira pessoa como é que um ser humano pode descer tão baixo e o que ele relatou foi simplesmente a sua história de vida sem metáforas ou romantismo. Limitou-se a ser prático, direto e eu diria até sereno. 
O Frank tem hoje 56 anos, consumiu drogas durante grande parte da sua vida, viveu cerca de 20 anos na rua, está limpo há dois anos. Ele levou-nos a conhecer as ruas de Amesterdão vista dos seus olhos.
Foi assim que ele começou: "Sou holandês, cresci neste bairro - no centro de Amsterdam, atualmente extremamente turístico - se me dissessem há 35 anos atrás naquilo que a minha vida se iria tornar eu diria que seria impossível e até rir-me-ia.....mas aconteceu e pode acontecer a qualquer um, sem exceção!". 
Nesta tour ele levou-nos aos antigos pontos críticos no mundo da droga em pelo coração de Amesterdão. As ruas bonitas que hoje os turistas tanto apreciam, cheias de lojas e restaurantes, onde se pode circular à vontade, há não muitos anos atrás eram circuitos de vendedores e consumidores de droga. Contou-nos todos os detalhes, coisas que eu estaria longe de imaginar. Por exemplo, os vendedores andam com pequenas doses de droga na boca para vender, caso os polícias os apanhem tem que a engolir para não irem presos. Contudo tem um limite de tempo para a colocar fora do organismo, caso contrário a morte é certa. Os truques são ingerir óleo para a defecar ou sal com coca-cola para a vomitar. Este é apenas um dos muitos pormenores que ele nos contou de um mundo tão violento e cruel. 
Ao longo de cerca de 35 anos consumiu drogas e desceu até onde podia. Viveu cerca de 20 anos na rua, começou por alugar pequenos quartos de hotel até que o vício não lhe permitiu desperdiçar dinheiro que não fosse para drogas. Viveu 10 anos na rua, debaixo da ponte (mostrou-nos qual era a ponte mais segura para dormir), vendeu, consumiu, passou droga no estômago, prostituiu-se, partiram-lhe o nariz seis vezes, as costelas outras tantas, têm vários cortes de faca cravados na pele, o coração parou duas vezes, uma das quais foi dado como morto...mas o seu coração teimou em bater novamente....Enfim foram duas horas de um relato de vida impressionantes. 
Há cerca de dois anos parou, continua limpo e quando lhe perguntei se tinha receio de uma recaída e respondeu-me firmemente que não, que já tinha vivido o suficiente no mundo da droga e que agira queria viver descansado o resto da vida. 
Termino também com uma das suas últimas citações. "Os primeiros anos a consumir drogas foram fantásticos, é um mundo que nos dá prazer, faz-nos felizes, consumimos para descontrair....é bom. Contudo há um limite e o problema é perceber quando chegamos ao limite e parar. O limite é quando já não conseguimos ser felizes e estar descontraídos sem drogas e aí parar é quase impossível...queremos acreditar que ainda temos o controlo, mas já há muito que o perdemos". 

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